Carta pastoral
Eleições legislativas 2019
“O futuro da nação está no teu voto livre e consciente”
Aos Religiosos
Aos Políticos e Governantes,
Aos Homens e Mulheres de boa vontade
No próximo dia 10 de março, o nosso povo é convocado, mais uma vez, a
exercer a sua soberania, no processo de escolha dos seus futuros dirigentes e, dada a importância social e política que as Eleições Legislativas revestem para o nosso
país, não podíamos ficar indiferentes.
Como
pastores,
nós, os Bispos da Guiné-Bissau, sentimos o dever de proporcionar aos nossos fiéis e aos demais homens e mulheres de boa vontade, um
contributo que os ajude a exercer o seu direito em consciência e liberdade.
A mensagem
que se dirige aos homens e mulheres
desta
nação, insere-se num facto inegável de desânimo de alguns de nossos irmãos e irmãs que, no início deste processo de recenseamento,
se manifestaram cépticos pelo ato, porque
nenhuma legislatura chegou ao seu fim.
O comportamento da classe política guineense, que não só não tem sido
encorajador como desanimador, tem contribuído para o crónico e vicioso ciclo de instabilidade política e governativa.
O país vive, como consequência de todo esse conjunto de fatores, num
clima de desconfiança generalizada, numa divisão insustentável quer entre os atores
políticos quer entre a população e mesmo nas famílias, o que aumenta ainda mais a
falta de esperança e confiança sobre uma possível mudança do estado actual.
Temos consciência
que o povo vê o futuro com muita apreensão
e frustração, pois a confiança, as expectativas e a esperança foram defraudadas: o
nível da pobreza que tem aumentado, a qualidade da saúde e da educação, que são sectores chaves para o desenvolvimento de qualquer nação, estão numa situação caótica, quebrados e em crise.
É precisamente neste contexto dúbio, de desencanto, que o povo é chamado
a decidir sobre o seu destino.
1. Com um olhar de esperança para o futuro
A
esperança é a virtude que nunca tem faltado ao nosso povo. Cada vez que
o país mergulha-se na crise e nos problemas; cada vez que o desespero bate à nossa
porta, nasce sempre em nós
uma luz de esperança, aquela esperança que
nos vem de Deus e não nos engana (cf Rom.5,5). Acreditamos que
Deus nos ama e caminha connosco.
A
nossa fé, impõe-nos que vos
exortemos, a depositar a esperança em Deus
nosso Salvador,
a
nunca
se
desesperar,
porque temos certeza
que Ele está connosco, quer o bem desta nação e de cada um dos seus filhos.
Caros irmãos
e
irmãs, como crentes,
nós
temos consciência que
Deus espera
que vivamos a fé com responsabilidade, que não nos esqueçamos que Ele
dignifica os proventos tirados do trabalho. Assim,
como diz o ditado “Si bu misti forel,
para balai” (Deus dá nozes,
mas não as quebra): o país não vai mudar, a nossa
situação não se alterará se não fizermos, afincadamente, algo por isso. Coloquemos
por isso, em Deus, as nossas ações, pedimos a Ele que ilumine a nossa escolha no
acto do voto. Que este voto seja a expressão do interesse comum.
2. Voto, expressão do respeito e a promoção do Bem Comum
Inspirando-nos no pensamento do Papa Francisco
que afirma que o futuro
das nações não está unicamente nas mãos dos seus dirigentes,
mas
sobretudo nas mãos dos povos, queremos
aqui reafirmar o seguinte: o futuro deste país, que custou
sangue e suor dos nossos antepassados,
está sobretudo nas mãos do
seu povo.
Somos chamados, mais
uma vez, a votar, a decidir
sobre o nosso futuro
através do voto que deve constituir a expressão
da “promoção
do Bem Comum que passa
por politicas que privilegiam a pessoa humana o seu pleno desenvolvimento”
(cf. Exortação da Conferencia Episcopal do
Senegal, Mauritânia, Cabo
Verde e
Guiné-Bissau, para a Quaresma de 2018)
No exercício do nosso direito de voto, não só entramos em comunhão
com outros eleitores, independentemente
das
respectivas escolhas e convicção política,
mas determinamos também o futuro
do nosso povo,
em
conjunto, pois
só
em
conjunto, o nosso voto consegue representar um
sim ou
um não a
um projeto
apresentado pelos candidatos. O exercício do direito
de voto exige de cada um de
nós uma responsabilidade
moral
e social, deve representar sempre uma visão de desenvolvimento da nossa nação, de reconhecimento e de salvaguarda dos valores
conquistados por todos aqueles que lutaram e lutam, se sacrificaram e se sacrificam para
o bem de todos.
Não percamos de vista que o nosso voto terá sentido se for expressão de solidariedade para com o bem-estar para cada um de nós e daqueles que virão
depois de nós.
O voto determina o bem-estar do povo, daí a necessidade de o seu
exercício ser com responsabilidade e em consciência.
3. Votar segundo a própria consciência
A necessidade e a pobreza em que se encontra boa parte
da população, leva atores políticos a se permitirem ofertas de bens materiais, com o intuito de
corromper a sua consciência. Nesse período,
acrescem a esta pobreza e necessidade,
outras fragilidades: o baixo nível de formação, a maior consciência de
pertença a um grupo étnico e religioso, e a falta de compromisso ético por parte de
alguns políticos que claramente, aproveitam estas tendências tribais e religiosas em
proveito próprio e em prejuízo do Estado.
Exortamos a população
a não se deixar corromper pelos partidos políticos,
porquanto equivaleria a vender a própria consciência, a própria dignidade, valores que sempre foram muito caros aos homens e mulheres desse país.
O guineense sempre foi caracterizado pela solidariedade, por
um
olhar compassivo
ao próximo, ao vizinho, ao irmão, aos hóspedes. Então não nos
esqueçamos que deixar que o nosso voto seja dado em troca de bens materiais, não constitui apenas uma violência à nossa consciência, mas ainda um negar de
solidariedade, de compaixão aos nossos próximos, uma perda da nossa identidade enquanto povo, um desprezo à humanidade de cada um de nós.
Vejamos, por isso, o perfil dos candidatos e os seus respectivos programas. Contribuamos
para
a
criação de
uma classe política,
competente, honesta,
consciente dos valores da democracia,
dos Direitos Humanos e preocupada
com a promoção do Bem Comum.
Ergamo-nos, não obstante todos os motivos para desânimo, como uma só pessoa,
como um único povo, para, de novo, escrevermos a nossa história com um olhar de esperança para o futuro.
4. Apelos
O
Papa
Francisco, na sua Mensagem
para o Dia Mundial da Paz deste
ano, propôs as «bem-aventuranças do
político». Fazemos nosso o
seu vibrante apelo:
§ “Bem-aventurado o político que tem uma alta
noção e uma profunda
consciência do seu papel.
§ Bem-aventurado o político de cuja pessoa irradia
a credibilidade.
§ Bem-aventurado o político que trabalha para o bem comum e não para os
próprios interesses.
§ Bem-aventurado o político
que permanece fielmente coerente.
§ Bem-aventurado o político que realiza a unidade.
§ Bem-aventurado o político que
está comprometido na realização
duma mudança radical.
§ Bem-aventurado o político que sabe escutar.
§ Bem-aventurado o político que não tem medo”
Apelamos ainda o seguinte:
o que cada guineense assuma o voto como um ato sagrado de cidadania. Vamos
votar, porque não é na “nha boka ka
sta la”, que vamos mudar o país;
o
que os Religiosos intensifiquem suas
orações para que o ato eleitoral
decorra da melhor maneira
possível, testemunhando
que o bem do País está acima de qualquer outro interesse;
o que haja respeito pelos adversários e sejam respeitadas as regras democráticas
o que a campanha eleitoral transcorra num ambiente de paz verdadeira, sem qualquer recurso à violência física ou verbal, ameaças ou intimidações;
o Que os candidatos saibam demonstrar apurada cultura política, pautando-se por uma campanha eleitoral pedagógica, elucidativa dos grandes desafios com que se depara o país e abstendo-se de argumentos que atentem contra a unidade nacional;
o que a recolha e controlo dos votos sejam efectivamente transparentes e que os resultados, assim legitimamente obtidos, sejam respeitados por todos os candidatos e eleitores, em espírito de verdadeira democracia;
o que as Forças de Ordem e Segurança, no seu ideal de sacrificar a vida em defesa
da pátria e do seu povo,
garantam a integridade
do território e a segurança efectiva dos cidadãos e dos seus bens;
o que a Comunidade Internacional continue a manifestar e a reforçar o seu apoio
à Guiné-Bissau para que possa, de fato, retomar o seu lugar no concerto das nações e ter condições propícias para investir no seu progresso.
Fazemos votos para que as Eleições Legislativas do dia 10 de Março, decorram num clima de paz, de liberdade, de estabilidade
e de
civismo, e sejam um
marco importante para o desenvolvimento do nosso povo.
Que o Deus Criador
e Todo-Poderoso abençoe a cada um de nós na Guiné-Bissau.
Bissau, 25 de fevereiro de 2019
Dom José Câmnate
na
Bissign Dom Pedro Carlos Zilli
Bispo de Bissau Bispo de Bafatá