P. Jaquité: “O que nos une é muito maior do que o que nos possa dividir"
O padre Jaquité fala-nos da Guiné-Bissau e do trabalho que aí tem desenvolvido e comenta o pontificado do Papa Francisco.
Rui Saraiva – Porto
O padre Keylândio Abdulai Jaquité é sacerdote católico da
Guiné-Bissau que, no entanto, nasceu muçulmano. Esteve 2 anos em
Portugal para concluir um mestrado em psicologia na Universidade
Católica e, ao mesmo tempo, foi vigário paroquial na Paróquia do
Santíssimo Sacramento na diocese do Porto. Antes do seu regresso à
Guiné-Bissau concedeu uma entrevista à Rádio Vaticano da qual
transmitimos agora a 2ª parte. O padre Jaquité fala do seu país e começa
por referir os trabalhos que tem desenvolvido no Seminário junto dos
mais jovens e também no âmbito do diálogo inter-religioso.
R: Enquanto sacerdote chamado a trabalhar na formação da juventude eu
senti que era uma responsabilidade. Dei tudo o que podia para o bem da
Igreja. E enquanto sacerdote nas comunidades onde trabalhei também
tentei ser essa figura de Cristo presente no seu povo. E já agora
acrescento uma outra parte que também acho interessante: participei
várias vezes em encontros, se calhar, porque sou de origem muçulmana
convertido ao catolicismo, no trabalho que a Igreja da Guiné faz no
diálogo inter-religioso. A Igreja tem vindo a caminhar de mãos dadas com
os nossos irmãos muçulmanos e evangélicos. Em diversas situações vai
havendo intervenção no sentido de tentar ajudar. E temos tido bons
resultados. Uma iniciativa, que existe já desde o tempo do nosso querido
e saudoso bispo, Dom Settimio Arturo Ferrazzetta, primeiro bispo da
diocese da Guiné na altura, hoje são duas, Bissau e Bafatá. Quando
chegar dependerá daquilo que o bispo me pedir. Se me pedir para
integrar, outra vez, esse grupo, com toda a vontade irei dar aquilo que
aprendi aqui.
P: E esse caminho de diálogo inter-religioso tem sido no interesse
das populações e na resolução de problemas concretos das populações?
R: Sim. Tem sido um trabalho interessante porque felizmente na Guiné
nós temos essas religiões e a convivência entre as religiões é pacífica.
O que dá mais maleabilidade para esse caminhar no diálogo nos trabalhos
pastorais, com ideias um pouco diferentes dependendo dos dogmas e
credos, mas, enfim, olhamos todos para aquela população a qual somos
chamados a servir. Por isso, eu acho que é positivo continuarmos a
caminhar nesse sentido.
P: De um ponto de vista mais social e político, como é que vê a situação na Guiné-Bissau nos últimos anos?
R: Nos últimos anos na situação na Guiné a Igreja tem tido uma
postura, como sempre, de tentar fazer as pessoas perceberem… É verdade
que houve períodos de instabilidade, mas, nós procuramos continuar a
dizer às pessoas para procurarem o diálogo. Já estamos quase a celebrar
os 20 anos daquele conflito político-militar que ceifou muitas vidas que
deixou marcas de instabilidade governativa e política. Mas, a Igreja
tem tido essa postura de mediação no sentido de não tomar partido mas de
fazer as pessoas perceberem e ver que, de facto, o que nos une é muito
maior do que aquilo que nos possa dividir.
P: Uma pergunta última sobre o pontificado do Papa Francisco.
Vamos no 6º ano de pontificado. Que comentário, neste momento, ao
pontificado do Papa Francisco?
R: Eu acho que fazer um comentário sobre o pontificado do Papa
Francisco é olhar para esta figura que hoje temos como Vigário de Cristo
na Terra, o Sucessor desta missão apostólica que Cristo deu a S. Pedro.
É uma bênção, termos um Papa como este que tem uma visão muito mais
ampla, no sentido de ir ao encontro das pessoas na suas realidades, nas
suas periferias. É verdade que o Papa iniciou uma mudança, uma caminhada
e, então, somos todos convidados a estar com ele, a rezar e a deixar
que as coisas caminhem conforme o Espírito. Porque o Espírito de Deus
está a agir como agiu outrora. O Santo Padre está a fazer um trabalho
maravilhoso. E é verdade que desde os tempos antigos houve pessoas que
poderão não estar de acordo e, às vezes, até hostis… Mas como disse o
Santo Padre há pouco tempo: é preciso rezar e calar. Quem reza pede a
ajuda de Deus e o calar é permitir esse silêncio para que o próprio Deus
nos fale no nosso interior. E nós todos os cristãos que estamos
espalhados pelo mundo fora somos convidados a estar com o Papa e a rezar
com ele a pedir a esse Deus que o chamou das periferias para dirigir a
Sua Igreja, que o assista e nos ilumine a nós. Mesmo nas nossas casas,
às vezes, em alguns assuntos podemos discordar mas não deixamos de ser a
mesma família. Portanto, somos famílias de Cristo e temos que perceber
que rezando e procurando consensos é que poderemos caminhar juntos.
O padre Keylândio Jaquité fez-nos companhia nos últimos dois
programas da rubrica “Sal da Terra, Luz do Mundo”. Regressou à
Guiné-Bissau após a sua experiência de estudo e de trabalho pastoral na
diocese do Porto. Para os guineenses e todos os que nos escutam no
continente africano enviamos uma saudação muito amiga. Aquele abraço.
Laudetur Iesus Christus