Tema de reflexão a caminho do sínodo diocesano
No conjunto dos sacramentos deveríamos descobrir o papel importantíssimo que o sacramento da UNÇÃO DOS DOENTES pode e deve ter na nossa evangelização e na nossa pastoral.
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Sabemos que é com o aparecer da doença que mais vacila a fé
dum cristão não bem formado: é mesmo na altura que se evidencia duma forma às
vezes "brutal" a "dicotomia" de que são vítimas muitos dos
nossos batizados: logo aparecem as dúvidas: de serem abandonados por Deus, de
ter culpas ocultas, desconhecidas, talvez herdadas dos antepassados, suspeitam
de serem vítimas de janfa, e não é
raro o recurso à divinação, o recurso à contra-janfa
com tanto de ronia ou de recurso ao mouro ou ao jambakoss. Sem falar da pressão psicológica exercitada pelos
familiares e parentes, de maneira particular quando se trata de doenças de
crianças.
Nada de estranhar: é um legado da própria cultura que tem
uma visão "holística" do ser humano em força da qual uma doença nunca
afeta uma pessoa só no plano físico, puramente biológico, atacável através de
remédios e mais nada: sempre há uma componente psicológica, moral (culpas não
expiadas de antepassados ou do próprio doente), até "cosmológica" (o
tal animal partner ou "gémeo",
mais ou menos o "totem", que partilha comigo o meu estado de saúde ou
de doença e que os Felupes chamam de "euwum
âi"). Todas razões que impelem a procurar algo de religioso ou de
mágico que se acompanhe com o tratamento propriamente medicinal. (Aliás não é
uma novidade que o estado psicológico do doente torna mais ou menos eficaz o
próprio tratamento medicamentoso: há uma interação, uma sinergia real entre as
duas dimensões da pessoa humana, a física e a espiritual.)
Nada de admirar também no que diz respeito ao recurso a algo
que transcende a pura e simples aplicação de remédios, não excluindo práticas menos
"racionais" ou menos "ortodoxas", porque isto acontece até
em culturas mais evoluídas, que até receberam o anúncio do Evangelho desde
muitos séculos.... e onde aparecem até novas ideologias segundo as quais não
valeria a pena de continuar a viver, desde que a vida tenha deixado de ser
saudável e " digna de ser vivida"; com o conseguinte à eutanásia.
O que mais aparece estranho, no caso de um doente cristão, é
o esquecimento total do recurso a Deus
através do sacramento da Unção dos doentes ou, quando alguém se lembra dele, o medo de chamar o padre porque isto seria
sinal de morte iminente.
Deveríamos organizar a catequese deste sacramento duma forma
diferente.
Não se trata de acantonar o que a própria Palavra de Deus
nos diz através da carta de Tiago e a Igreja nos explica falando de Deus que
vem visitar o doente com a sua misericórdia testemunhada até pela comunidade
cristã (a Igreja de que fala o próprio Tiago, representada não só pelo padre,
mas, onde e quando for possível com a devida preparação, também por membros da
comunidade.)
Em comunidades com um número consistente de membros idosos
ou de limitada "vida social" devido ao peso da idade ou de doença, já
acontece que este sacramento, que pode ser repetido, seja proposto de vez em
quando, para ser celebrado na comunidade com os doentes que podem estar presentes,
sendo depois "levado" aos que não puderam aparecer. Costumamos levar
a comunhão: podemos dar espaço também a este sacramento, celebrando-o até com
uma certa solenidade?
Porque não associar o aparecer da doença a uma chamada de
Jesus a se unir ao seu sacrifício da Cruz para a salvação dos homens? Não seria
fácil nesta perspetiva associar esta chamada à figura de Simão de Cirene, o
Cireneu que carregou com a cruz de Jesus? Não quer dizer resignar-se
definitivamente à doença: parece que o Cireneu não carregou a cruz até ao
Calvário; com certeza não foi pregado nela. Só se tratou dum episódio da sua
vida, depois do qual continuou a tratar dela. O mesmo pode acontecer ao cristão
que recebe o sacramento da Unção dos enfermos, desde que não espere a chamar o
padre nas últimas fases da doença, mas o faça desde que a doença comece a
preocupar e a ser um problema para ele.
Desta forma o sacramento dos doentes apareceria rico de um
dinamismo apostólico capaz de contrastar qualquer dúvida ou medo capazes de
"desequilibrar" a fé do doente.
A perspetiva "vocacional" que o sacramento
assumiria é capaz de fazer aparecer no pensamento do doente que "vale a
pena" de entregar esperanças e medo, dúvidas e sofrimento nas mãos de
Jesus em prol de.... e aí vão as
intenções que justificam a aceitação "dinâmica" da provação que a doença
em si mesmo representa. Ela não deixa de ser algo negativo na vida de uma
pessoa, que continua a lutar para recuperar a saúde, mas é
"transfigurada" assumindo algo que se parece com a cruz que, de
instrumento de morte foi transformada por Cristo em fonte de vida nova.
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NB. O que acabo de dizer não é só fruto de raciocínio ou de
mera especulação, mas sim vem da minha experiência pessoal: trata-se da atitude
que, com a ajuda de Deus e do exemplo de pessoas que conheci, eu próprio assumi
desde que em 1997 me foi diagnosticada a primeira das doenças que
sucessivamente apareceram na minha vida e me vão acompanhando ao longo dos
anos; para mim elas se tornaram como que uma vocação ulterior com que Deus me
gratificou: o que me proporciona a paz interior que torna ainda mais eficaz a minha
"colaboração" com os remédios com que tento contrastar os efeitos das
doenças, defendendo a vida que sempre é um dom de Deus.
Brugherio (It) 6.6.16
Padre Zé Fumagalli
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